Em janeiro foi publicada a Lei Complementar (LC) nº 214/25, após aprovação e sanção do Projeto de Lei Complementar (PLP) nº 68/24, que regulamenta grande parte da Reforma Tributária sobre o consumo.
Essa nova lei complementar institui a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), bem como estabelece as principais regras do Imposto Seletivo (IS), que incidirá sobre produtos prejudiciais à saúde e ao meio ambiente.
Conforme mencionado nos primeiros artigos desta série sobre a Reforma Tributária, uma das principais mudanças introduzidas no sistema tributário brasileiro pela Emenda Constitucional (EC) nº 132/2023 é a substituição de tributos federais, estaduais e municipais (PIS, COFINS, IPI*, ICMS e ISS) por dois tributos de caráter nacional: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência da União, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), de competência compartilhada entre os Estados, o Distrito Federal e os Municípios.
A LC nº 214/25 também elegeu as regras que definem o critério temporal e espacial da CBS e do IBS.
Em regra, a disposição literal dos dispositivos da LC nº 214/25 determina que se considera ocorrido o fato gerador da CBS e do IBS no momento do fornecimento de bens ou serviços, ainda que de execução continuada ou fracionada. Para fins da legislação complementar, no caso dos serviços em geral, o fornecimento é considerado ocorrido no momento do seu término.
Nas operações de execução continuada ou fracionada que não seja possível identificar o momento de entrega ou disponibilização do bem, ou o término do fornecimento do serviço – como ocorre nos casos de abastecimento de água, saneamento básico, gás canalizado, serviços de telecomunicação, serviços de internet e energia elétrica –, considera-se ocorrido o fato gerador quando o pagamento se tornar devido.
Apesar das regras acima, a LC nº 214/25 também determina que, caso o pagamento ocorra antes do fornecimento dos bens ou serviços, seja ele integral ou parcial, os tributos serão exigidos antecipadamente, de forma proporcional ao valor pago. Também prescreve que, neste caso, a base de cálculo corresponderá ao montante pago e será calculado mediante a aplicação da alíquota vigente na data do pagamento de cada parcela.
Posteriormente, os valores deverão ser recalculados com base no valor total da operação e nas alíquotas vigentes na data do término da prestação. Portanto, se as antecipações forem inferiores ao valor definitivo do tributo, a diferença será registrada como débito na apuração; caso sejam superiores, o contribuinte poderá apropriar essa diferença como crédito.
Em outras palavras, o critério temporal do fato gerador é o término do fornecimento, porém o recolhimento do tributo será antecipado se também for antecipado o pagamento pelo adquirente. A antecipação do tributo, contudo, não antecipa a ocorrência do fato gerador, motivo pelo qual deve ocorrer o cálculo do valor definitivo no término do fornecimento.
Nos casos em que há o pagamento antecipado do tributo, mas o fornecimento dos bens ou serviços não ocorre, a LC nº 214/2025 prevê que o fornecedor poderá apropriar créditos correspondentes ao valor pago.
Outras hipóteses específicas do critério temporal incluem:
Quanto ao critério espacial da CBS e do IBS, para definir o local da operação é necessário, antes, identificar a natureza do bem ou serviço envolvido, como:
A definição do local de operação é essencial, uma vez que a alíquota do IBS incidente sobre cada operação corresponderá à soma das alíquotas previstas nas legislações do Estado, Distrito Federal e do Município de destino (local da operação).
Diferentemente do sistema atual, o local do exercício das atividades do fornecedor é irrelevante, uma vez que será aplicada a alíquota do destino, o que contribui para a manutenção do princípio da neutralidade, abordado de forma detalhada no primeiro artigo desta série.
Esse modelo busca eliminar, ou ao menos mitigar, diversos problemas presentes em nosso sistema há décadas, como as chamadas guerras fiscais, geradas pela concessão de inúmeros benefícios fiscais por entes subnacionais (estados e municípios) e a complexidade do sistema, com repartição do recolhimento do tributo a entes tributantes diversos no mesmo fato gerador (parte recolhido em favor da origem e parte em favor do destino), o que pode impactar a escolha do local de instalação de empresas, por exemplo.
A compreensão dos critérios temporal e espacial da CBS e do IBS será fundamental para os contribuintes adaptarem suas operações às novas regras, garantindo a correta apuração dos novos tributos e o cumprimento adequado das obrigações tributárias.
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*O IPI não será extinto, mas terá alíquota zero, exceto para os produtos com industrialização incentivada na Zona Franca de Manaus.