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CENÁRIO DA REFORMA TRIBUTÁRIA: ASPECTOS GERAIS DA CBS E DO IBS

04.09.2024 Artigos

A Emenda Constitucional (EC) nº 132/2023, aprovada no final de 2023, instituiu a denominada Reforma Tributária com foco nos tributos incidentes sobre o consumo.

Das principais mudanças implementadas no sistema tributário brasileiro, destaca-se a substituição de tributos federais, estaduais e municipais (PIS, COFINS, IPI[1], ICMS e ISS) por dois tributos de caráter nacional, a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência da União, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), de competência compartilhada entre os Estados, Distrito Federal e Municípios.

Entre as características desses novos tributos, a EC nº 132/2023 prevê o princípio da neutralidade, o que significa que a CBS e o IBS, diferente dos tributos atuais, não devem influenciar na estruturação das operações e decisões econômicas/comerciais dos contribuintes.

A neutralidade é importante para afastar diversos problemas presentes em nosso sistema há décadas, como as chamadas guerras fiscais, geradas pela concessão de inúmeros benefícios fiscais por entres subnacionais (estados e municípios), o que influenciam diretamente nas decisões dos contribuintes quanto ao local de instalação das suas empresas, por exemplo.

Esse princípio também resulta em redução de transações potencialmente afetadas por tributos cumulativos como o ISS no meio das cadeias, especialmente de produção e comercialização, ou mesmo em casos em que o PIS/COFINS é cumulativo para uma empresa (à alíquota de 3,65%), mas que fornece insumos a terceiros sujeitos ao regime da não cumulatividade, quando os adquirentes podem se creditar à alíquota de 9,25%.

Com vistas a garantir sua aplicação, o legislador optou por mecanismos importantes e um pouco diferentes de como foram instituídos aos tributos atuais, a exemplo de uma não cumulatividade que se diz “plena”, mediante um creditamento amplo, bem como pela tributação no destino.

A alíquota será única para todos os bens e serviços, excetuados alguns regimes específicos previstos na Constituição Federal, como serviços de educação, saúde e medicamentos. O Senado Federal fixará a alíquota de referência para cada esfera federativa, a qual será aplicável no caso de um ente federativo não fixar sua alíquota própria por lei específica.

Alíquota única, contudo, não implica em uma única alíquota em todos os estados e municípios. Isso, porque esses entes tributantes podem optar por sua alíquota específica, desde que essa alíquota seja única para todos os bens e serviços transacionados em seu território, com as exceções acima indicadas.

A fixação das alíquotas pelos Estados e Municípios poderá ser realizada por lei ordinária e será calculada mediante o somatório das alíquotas do Estado e do Município de destino da operação. Portanto, independentemente de onde a empresa exercer sua operação, as alíquotas aplicadas serão aquelas do destino, o que auxilia na manutenção do princípio da neutralidade.

Além de haver uma alíquota única, a CBS e o IBS não serão objeto de concessão de incentivos e benefícios financeiros ou fiscais relativos ou de regimes específicos, diferenciados ou favorecidos de tributação, excetuadas as hipóteses previstas a Constituição, outra regra necessária para garantir o princípio da neutralidade.

Essa inovação é relevante porque também auxilia na simplificação do sistema tributário, uma vez que haverá uma mesma carga tributária para todas as operações ocorridas dentro de um mesmo ente tributante. Em outras palavras, a alíquota do IBS para o Estado de São Paulo será única para todas as operações dentro do estado de São Paulo, o mesmo ocorrerá, por exemplo, com as operações no município de São Paulo, de Barueri ou do Rio de Janeiro.

A CBS e o IBS também serão não-cumulativos havendo a previsão constitucional de uma base de crédito muito mais ampla do que a prevista hoje para PIS, COFINS, IPI e ICMS. Por isso, acredita-se que haverá uma cumulatividade menor de tributos.

As novas regras permitem que os contribuintes, ao adquirirem quaisquer bens e serviços ou tiverem despesas com aluguel de imóveis, máquinas ou equipamentos, por exemplo, poderão deduzir o imposto pago pelos seus fornecedores de bens ou serviços, o que reduz significativamente o montante a pagar em suas operações.

Outro ponto relevante é que a Constituição Federal dispõe expressamente que os novos tributos não integrarão sua própria base de cálculo (cálculo por fora) nem a de outros tributos, o que diminui a carga tributária envolvida nas operações e encerra discussões existentes até hoje no poder judiciário como sobre a exclusão do ISS sobre a base de cálculo do PIS e da COFINS ou até mesmo a exclusão do PIS e da COFINS sobre as suas próprias bases.

Considerando que um dos principais objetivos da reforma é a unificação da tributação sobre o consumo, a CBS e o IBS terão legislação única e uniforme em todo o território nacional, o que pretende gerar uma maior simplificação do sistema, haja vista que atualmente cada um dos 26 estados e Distrito federal e dos mais de 5.500 municípios possuem legislação própria em relação ao ICMS ou ao ISS. Portanto, deve reduzir o custo de conformidade fiscal das empresas.

É de se ressaltar que a nova base tributável é mais ampla em comparação aos dos tributos substituídos, especialmente no que se refere ao ICMS e ao ISS. Muitas operações que antes não sofriam a incidência desses tributos, a exemplo da locação de bens móveis e imóveis, passarão agora a ser tributadas pela CBS e IBS.

Isso, porque, como será detalhado no próximo artigo da nossa série sobre a Reforma Tributária, os critérios materiais (ou o fato gerador) desses dois novos tributos são idênticos e englobam todas as “operações com bens materiais ou imateriais, inclusive direitos, ou com serviço”, até mesmo em importações, ainda que o importador não seja sujeito passivo habitual do tributo. Por isso, há a expectativa de que muitos setores sofram aumento de carga tributária, enquanto outros poderão ter uma redução, sendo necessária uma análise individual detalhada.

Em contrapartida, considerando a regra de tributação no destino, a CBS e o IBS não incidirão sobre as exportações. No entanto, o exportador poderá aproveitar os créditos relativos às operações nas quais seja adquirente de bem material ou imaterial, inclusive direitos ou serviços.

Todas essas mudanças deverão ser regulamentadas por legislação específica, em especial lei complementar, bem como deverá obedecer a uma transição gradual e já prevista na referida Emenda entre os anos de 2026 e 2033[2].

O Poder Executivo já apresentou o Projeto de Lei (PLP) nº 68/2024 para instituir e regulamentar o CBS, IBS e IS, bem como o PLP nº 108/2024, para tratar de questões relativas ao Comitê Gestor do IBS, o processo administrativo tributário do IBS, a transição do ICMS para o IBS, entre outras matérias.

O PLP nº 68/2024 teve sua tramitação encerrada na Câmara dos Deputados após aprovação do texto substitutivo em 10/07/2024 e foi remetido para análise do Senado Federal, quando deverá seguir o regular trâmite legislativo. Já o PLP nº 108/2024 teve aprovação do seu texto-base na Câmara dos Deputados, mas resta pendente a análise dos destaques antes de seguir ao Senado. Portanto, esses PLPs poderão sofrer alterações importantes, inclusive envolvendo diversos dos aspectos gerais aqui tratados.

Nosso time especializado em Direito Tributário está à disposição para esclarecer dúvidas.

[1]O IPI não será extinto, mas terá alíquota zero, exceto para os produtos com industrialização incentivada na Zona Franca de Manaus.

[2] Essa transição será ainda mais longa para os entes tributantes. Há, por exemplo, previsão de compensação de queda arrecadatória para os Estados que deverá ocorrer até 2077. Por tratarem de regras que não alteram o cotidiano dos contribuintes.

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